Fragmento do Prefácio de Fernando Rosas do livro póstumo de
Flausino Torres, Diário da Batalha de Praga, texto inédito escrito em 1968, agora editado pelas Edições Afrontamento com apresentação e notas de Paulo Torres Bento.
( ) este Diário é o de uma Batalha, batalha não só do povo checoslovaco contra o invasor e as forças obscuras que reemergiram da sombra e do passado recente para barrar o novo curso de Dubcek e da sua equipa de reformadores. Batalha também, e para tantos decisiva e derradeira, de muitos militantes comunistas portugueses (desde logo os exilados nos países do leste) pela coerência de um ideal que deles e das suas vidas tinha feito quase tudo o que eram, um ideal que sentiam resgatado, renascido, pelo socialismo de rosto humanoanunciado pela Primavera de Praga, isto é, pelas mudanças operadas na direcção e no programa do PC da Checoslováquia a partir de Janeiro de 1968, quando Dubcek, a face da mudança, assume a direcção do partido, e na prática, do Estado. Batalha que mobiliza totalmente o intelectual comunista Flausino Torres, então leitor de Cultura e Língua portuguesa na Universidade de Karlova, em Praga, e vários dos seus camaradas de um exílio feito de muitas dúvidas e desilusões com a experiência do socialismo real. Estava ali, afinal, a alternativa, o reencontro do socialismo consigo próprio, com o que entendiam, como nestes textos nos dá conta Flausino Torres, ser a sua essência de humanitarismo, democracia, participação operária e cidadã, liberdade, independência nacional, dignidade, em suma. Por tudo isto, combate que os faz chocar de frente, e no caso de Flausino usando uma violência verbal e escrita sem precedentes, com a direcção do PCP e o próprio Álvaro Cunhal, designadamente numa decisiva e tempestuosa reunião que se realiza, em Novembro de 1968, em Praga, da qual resultará o seu afastamento das fileiras do partido em que militava desde o final dos anos trinta. ( ).